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Não há dúvidas, o grande destaque de 2017 foi o livro do menino do Acre

Rodrigo Casarin

20/12/2017 09h57

Não há espaço para dúvidas: o grande destaque dentre as minhas leituras neste 2017 foi "TAC – Teoria da Absorção do Conhecimento", escrito por Bruno Borges, autor mais conhecido pela alcunha de "menino do Acre". Publicado pela Arte e Vida, a obra, como apontei na resenha escrita em agosto, não é apenas presunçosa, tola e mal escrita, mas a pior coisa que já li na vida. Pode parecer exagero considerar a leitura de um troço desses algo marcante, mas, para quem está a todo tempo lendo e, de alguma forma, avaliando livros, foi um divisor de águas encontrar algo que sirva de exemplo cabal do que é péssimo. Já tinha lido textos que mereceriam nota 1, 2, 2,5… "TAC – Teoria da Absorção do Conhecimento" superou todos esses e se transformou no meu parâmetro para o que é digno de zero absoluto.

Mas também li muita coisa boa ao longo de 2017, claro. Não gosto de falar em "melhores livros do ano" (acho desonesto, precisaria ter lido absolutamente tudo o que foi publicado para sustentar uma pauta do tipo), tampouco costumo me limitar ao que foi lançado no ano corrente. Por isso, a relação abaixo compreende os livros que li no período em questão e que de alguma forma merecem destaque (basta clicar nos títulos grifados para ler textos que escrevi sobre as respetivas obras). Comecemos pela literatura nacional.

Alberto Mussa manteve excelente nível em "A Hipótese Humana" (Record), quarto volume da sua série de romances policiais que se passam em diferentes séculos da história do Rio de Janeiro. "Da Poesia" (Companhia das Letras), que reúne todos os poemas de Hilda Hilst, a próxima homenageada da Flip, é precioso. Marcelo Moutinho realmente mereceu o prêmio de contos da Biblioteca Nacional por conta do seu "Ferrugem", galardão que também ficaria em ótimas mãos se tivesse ido para Giovana Madalosso, autora de "A Teta Racional" (Grua), no qual há um texto estupendo sobre os horrores da maternidade.

Ainda na literatura daqui, Eric Novello por "Ninguém Nasce Herói" (Paralela), Marcelo Mirisola por "Como se me Fumasse" (Editora 34), Fabiano Costa Coelho por "O Lume e o Agreste" (Confraria do Vento), Samir Machado de Machado por "Quatro Soldados" (Rocco) e Ronaldo Bressane por "Escalpo" (Reformatório) merecem atenção de outros leitores.

Indo para os gringos, talvez a melhor leitura do ano: John Williams, autor dos Estados Unidos que ficou décadas no limbo. São excelentes tanto "Stoner" quanto "Butcher's Crossing", que saíram por aqui pela Rádio Londres. Escrevi sobre ambos em fevereiro e o escritor Miguel Sanches Neto veio me perguntar qual achava melhor. Na época não soube responder, mas, desde então, "Butcher's Crossing" permaneceu assombrando a minha memória. Com frequência lembro de cenas com centenas de búfalos sendo esfolados e a marcante travessia de um rio, já no final da narrativa. Creio que tenha sido, de fato, a leitura mais marcante.

Continuando nos estrangeiros, também gostei absurdamente de "O Conto da Aia" (Rocco), de Margaret Atwood, livro de 1985 transformado em uma elogiada série neste ano – por antecipar muito do que estamos vendo e prevendo com o governo Trump nos Estados Unidos, torna-se um título incontornável. Destaque também para "Laços" (Todavia), de Domenico Starnone, "O Ruído do Tempo" (Rocco), de Julian Barnes, "O Ódio que Você Semeia" ("Galera"), de Angie Thomas, e "Silêncio" (Tusquets) de Shusaku Endo.

Na não ficção, "Mães Arrependidas" (Civilização Brasileira), de Orna Donath, sobre mulheres que, se pudessem voltar no tempo, optariam por não ter seus filhos, impressionou, bem como "Desterros" (Elefante), de Natalia Timerman, sobre a vida em um hospital-prisão de São Paulo, e "O Último Abraço" (Record), de Vitor Hugo Brandalise, sobre um homem que explodiu a própria esposa por amor. São boas as histórias de "Baladas Proibidas" (Record), de Gabriel Godoy e Bolívar Torres, e "Cosa Nostra no Brasil" (Companhia das Letras), de Leandro Demori.

Dente as biografias, louvas para "Leonardo Da Vinci" (Intrínseca), de Walter Isaacson, e "Joseph Fouché" (Zahar), de Stefen Zweig, francês nascido no século 18 que parece ser uma caricatura dos nossos atuais políticos. Mas o que melhor li de não ficção foi "Instrumental" (Rádio Londres), a brutal e inclemente autobiografia do pianista britânico James Rhodes.

Cena de "Uma Noite em L'Enfer".

Também merecem ser lidos por todos "Uma História do Samba – Volume 1" (Companhia das Letras", de Lira Neto, "O que É Fascismo? E outros Ensaios" (Companhia das Letras), de George Orwell, e "Coisas Nossas" (José Olympio), de Luiz Antonio Simas. Ah, e "Revolução Russa" (Todavia), de Sheila Fitzpatrick, e "Outubro" (Boitempo), de China Mieville, me ajudaram a entender um pouco melhor o que se passou há cem anos, quando os comunistas chegaram ao poder russo.

Continuando por aquelas bandas, não há dúvidas de que a HQ mais marcante e emocionante do ano foi "Laika" (Barricada), de Nick Abadzis. Já a mais bonita é "Uma Noite em L'Enfer" (Mino), de Davi Calil. Também gostei bastante da adaptação de "O Velho Mar" (Bertrand) feita por Thierry Murat, de "Angola Janga" (Veneta), de Marcelo D'Salete, "Cão" (Mino), de Breno Ferreira,"Baiacu" (Todavia), organizada por Laerte e Angeli (e que nem sei bem se deveria entrar como HQ), "Não Era Você que eu Esperava" (Nemo), de Fabien Toulmé, e "A Diferença Invisível" (Nemo), de Julie Dachez e Mademoiselle Caroline.

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Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.