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Festival da Embriaguez: devoção, muita bebida e sexo no antigo Egito

Rodrigo Casarin

28/11/2018 10h53

Se você é desses que acha lamentável quando alguém passa um pouco da conta na bebida, ficaria horrorizado se pudesse presenciar o Festival da Embriaguez que rolava no antigo Egito. O furdunço celebrava Hathor, deusa associada à alegria, ao sexo e ao álcool. Num canto à beira do Nilo, os fiéis se reuniam para esperar que a homenageada chegasse pelo rio. A imagem de Hathor (ou uma pessoa a representando) aparecia em uma pequena barca junto com um sacerdote, que carregava consigo um recipiente cheio de cerveja para ofertar à divindade.

Então Hathor era levada até o templo onde a cerimônia prosseguia com danças e outros rituais. Não demorava para que o faraó se desse por satisfeito e deixasse o local. Era aí que a festa começava de verdade. Pouca comida, muito vinho e cerveja e um único objetivo: ficar bêbado em homenagem à deusa. "Sim, vamos beber e comer do banquete! Vamos nos regozijar, regozijar e regozijar de novo! Que Bastet [uma das identidades de Hathor] esteja aos nossos pés! Vamos nos embriagar por ela em seu festival da embriaguez", pregava um sacerdote.

Enquanto isso, todos manguaçavam. Na sequência vinha o outro momento do ritual: "Deixe-o beber, deixe-o comer, deixe-o f*der", incentivava o sacerdote. Aí o Festival da Embriaguez se transformava em uma imensa orgia em nome de Hathor – crianças que nasciam desses encontros entre desconhecidos se vangloriavam pela concepção em um momento tão nobre.

"Bebida significava sexo para os egípcios, assim como sexo significava bebida", registra o escritor britânico Mark Forsyth em "Uma Breve História da Bebedeira – Como, Onde e Por Que a Humanidade Tomou Umas da Idade da Pedra Até Hoje" (Companhia de Mesa), de onde retirei essas informações sobre o Festival. Vasculhando o passado, o autor mostra como o álcool acompanhou o homem durante boa parte de sua história, tornando-se não apenas um fiel parceiro para os momentos de alegria, tristeza ou pasmaceira, mas sendo um fator de grande influência para diversas transformações culturais e sociais.

Assim, descobrimos que os surmas só começavam a trabalhar depois de bebericar algo – vale lembrar do valor nutritivo das bebidas fermentadas – , que a tribo tiriki derramava cerveja sobre a cova dos seus antepassados e que "quando os antigos persas tinham que tomar uma decisão política importante, debatiam o tema duas vezes: uma bêbados e outra sóbrios. Se chegassem à mesma conclusão em ambas, agiam".

Forsyth também nos lembra que o Código de Hamurabi trazia leis específicas e bem rígidas relacionadas à qualidade e à venda das bebidas, que há menções no Corão que pregam que o Paraíso é abençoado com rios de vinho, que Abu Nuwas, um dos maiores poetas árabes da história, adorava escrever cantigas em homenagem ao goró e que a Revolta do Rum marcou o início da colonização britânica na Austrália.

Apesar de piadinhas desnecessárias e alguns equívocos aqui e ali – como o anacronismo de imaginar que pessoas jogassem futebol, que surge no século 19, no pátio de igrejas durante a Idade Média –, "Uma História da Bebedeira" é daqueles livros cheios de boas histórias e informações curiosas (asseguradas pelas muitas referências bibliográficas). É daqueles livros que merecem ser lidos acompanhados de um vinho ou uma cerveja, sem dúvidas.

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Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.