Álbum da Copa é a pior coisa que alguém pode colecionar, mas todos o amam
Rodrigo Casarin
20/03/2018 10h19
O japonês Shusaku Nishikawa é goleiro. O senegalês Lamine Gassama tem 1,81m de altura. Anice Badri joga no Espérance Sportive de Tunis, time de seu país natal, a Tunísia. O sérvio Aleksandar Prijovic pesa 85kg. O islandês Arnór Ingvi Trautson nasceu no dia 30 de abril de 1993. Os cinco vieram em um dos primeiros pacotinhos que comprei com as figurinhas do álbum da Copa deste ano.
Com R$2,00, tenho acesso a cinco cromos com informações pouco precisas (será que Prijovic não ganhará peso até chegar na Rússia? Será que Gassama será mesmo convocado para defender Senegal?) e que poderiam ser adquiridas a qualquer momento, de graça, com uma simples consulta na internet. Isso se eu realmente quisesse saber quando Trautson nasceu, é claro. Racionalmente falando, não conheço uma coleção pior do que juntar figurinhas do álbum da Copa.
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E a coisa fica ainda mais bizarra. Ao todo serão 682 cromos: se você der uma sorte que inexiste ou for completamente preciso nas trocas, precisará comprar pelo menos 137 pacotinhos para que consiga preencher todo o álbum (e ainda ficará com três figurinhas repetidas, que provavelmente serão coladas na capa de algum caderno). Ou seja, para completar o álbum terá que gastar pelo menos R$274 só comprando figurinhas (o suficiente para fazer um bom churrasco com fraldinha, gorgonzola, linguiça cuiabana, pão de alho e cerveja). Isso sem falar no preço do próprio álbum, com opções a R$7,90 e R$49,90. E isso para ter centenas de fotos de jogadores que você nunca ouviu falar, pelos quais não tem a menor simpatia e com informações que você não faz a mínima questão de saber.
Mas, em que pese todo esse lado racional, como não amar o álbum?
Alguém até poderia argumentar que, a longuíssimo prazo, o investimento pode ser interessante. No site Estante Virtual, por exemplo, há gente tentando vender o álbum da Copa de 1962 por R$1259, o da Copa de 1970 por R$1300 e o da Copa de 1974 por R$ 590 (uma pechincha justificada pela ausência de 114 dos 297 cromos necessários para que a edição daquele ano estivesse completa). No entanto, tratar a coleção como um investimento para as décadas seguintes seria um argumento totalmente ridículo.
Fosse o mundo feito de homens-planilha, a Pannini não conseguiria vender um pacotinho de figurinhas sequer. Mas, como sabemos, ainda há quem se preocupe mais com a diversão do que com a apática racionalidade dos números – pelo menos em alguns casos, pelo menos de quatro em quatro anos. Sou um desses. Em 2002, com toda a maturidade dos meus 15 anos, cedi ao lado cerebral e não colecionei o álbum da Copa do Japão e da Coreia; preferi comprar um frio almanaque com todas as informações precisas, completas e a um preço muito mais em conta. Me arrependo profundamente. Não há magia alguma naquela joça.
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Legal mesmo é fazer bolão para ver quem acerta quais jogadores estão no álbum e não irão à Copa. Legal mesmo é acumular aquele bolo de cromos repetidos que cresce a projeções inexplicáveis depois que já enchemos metade do álbum. Legal mesmo é passar raiva com a molecada que acha que figurinha brilhante tem que ser trocada por três figurinhas comuns e que o Neymar, o Cristiano Ronaldo e o Messi só podem ser negociados por um pacotinho fechado – já tirei esses três pangarés e até poderia me alimentar dessa sórdida tática, mas sou completamente contra a especulação nesse nobre mercado. Legal mesmo é trocar figurinhas com meu pai.
Então, por favor, se alguém aí tiver o Cueva repetido, avise, é um dos jogadores que faltam para que eu complete a seleção peruana. (Aliás, pela bola que esse não vem jogando, é uma boa aposta para o "gente do álbum que pode não ir para a Rússia").
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Sobre o autor
Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.
Sobre o blog
O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.