Massacre de Realengo inspira livro sobre amizade e violência contra garotas
No dia sete de abril de 2011, um ex-aluno invadiu o colégio Tasso da Silveira, no subúrbio do Rio de Janeiro, portando dois revólveres. Foram mais de trinta tiros que deixaram 12 estudantes mortos, numa tragédia que ficou conhecida como o Massacre de Realengo. Jornalista com passagens por empresas como Canal Futura, Editora Abril e HuffPost, a catarinense Daniela Kopsch trabalhou na cobertura do ataque contra as crianças e adolescentes. Especialista em literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, agora Daniela lança "O Pior Dia de Todos" (Tordesilhas), romance inspirado no que viu em Realengo e ouviu de sobreviventes e familiares das vítimas.
"Eu me envolvi demais com o trabalho, com as meninas que entrevistei – e senti que havia ali uma história que eu queria contar, uma história que ia além daquela notícia. Depois disso, acho que a trama do romance se desenvolveu sozinha em algum canto do meu inconsciente, porque quando me sente para começar a escrever, anos depois, sinto que a narrativa se contou sozinha", conta Daniela.
O centro narrativa de "O Pior Dia de Todos" é dividido entre Malu e Natália, primas que representam "meninas que existem em todo o Brasil", como registra a escritora no posfácio do volume, e que conduzem uma narrativa que discorre principalmente sobre a amizade. A dupla representa ainda uma escolha de Daniela: focar a história principalmente nas garotas que sobreviveram ao crime.
"O atirador queria matar meninas, esse era o objetivo dele quando entrou na escola. Dos 12 alunos que morreram naquele dia, dez eram meninas", recorda. "O caso de Realengo é um resultado doloroso de uma sociedade que odeia mulheres. Foi essa a linha de pensamento que me fez contar uma história sobre meninas. As personagens mostram como é a experiência de crescer menina no Brasil – percebendo, aos poucos, como é uma experiência perigosa", continua, fazendo-nos lembrar dos frequentes casos de feminicídio pelo país.
Por conta da profissão, não surpreenderia se Daniela optasse por escrever um livro-reportagem a respeito da tragédia. Contudo, afirma que a escolha pela ficção foi um caminho "natural", uma via para despertar ainda mais a empatia do leitor. "Acho que intuitivamente entendi que a ficção acessa de modo diferente as emoções do leitor. Nós conseguimos nos colocar no lugar do outro com mais entrega quando lemos um romance e eu busquei essa empatia. Quero que o leitor conheça essas meninas".
Quando o livro estava prestes a chegar às livrarias, um massacre semelhante àquele ocorrido em Realengo voltou a entristecer o país. Dessa vez o crime se deu numa escola em Suzano, no último dia 13 de março, também foi protagonizado por antigos alunos do colégio e deixou 10 mortos, incluindo os assassinos. Na entrevista, a escritora afirma que aquele crime de 2011 foi o primeiro do tipo ocorrido no Brasil, mas não seria mesmo o último. "Nós vivemos hoje uma receita para que isso volte a acontecer: a cultura de ódio que só aumenta e o acesso facilitado às armas. Há poucas semanas, um decreto autorizou o acesso de armas para crianças e jovens praticarem tiros. É uma tragédia anunciada".
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