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Flip se consolida como festa de casas e editoras independentes

Rodrigo Casarin

29/07/2018 23h14

Barco da Flipei. Foto: Divulgação/ Flip.

O "I" de Flip agora significa "Independente", não mais "Internacional". Foi o que ouvi de um dos muitos editores presentes na imensa programação paralela da Flip deste ano. Há certo exagero na brincadeira, claro, mas ela representa muito bem o que foi a edição que acabou há pouco da Festa Literária Internacional de Paraty.

Há anos que a Flip extrapola as conversas do palco principal e toma corpo graças às inúmeras atividades que acontecem em casas espalhadas pelo centro histórico da cidade. Em 2018 essa tendência tomou uma proporção nunca vista antes. Com a organização da própria Flip abraçando mais de 20 espaços como parceiros, por onde andava o que se via eram mesas abarrotadas de gente interessada em discussões que iam desde a presença das lésbicas negras na literatura – como aconteceu na Casa Insubmissa de Mulheres Negras – até cursos para novos escritores, uma das atrações da programação da Paratodxs. Por extensão, dezenas de pequenas editoras puderam mostrar seus livros a um público ávido por novidades. Difícil achar alguém que tenha se queixado do movimento ou das vendas.

"Vim no ano passado, fiquei apenas na sexta-feira e este ano pedi para ter um espaço durante toda a Flip. A casa aqui vive cheia e tive um crescimento nas vendas até maior do que eu esperava. Foi um golaço", diz Sílvio Testa, editor da Instante, uma das mais de 30 editoras presentes n'A Casa da Porta Amarela, espaço colaborativo que levou a Paraty um pouco do que vemos em São Paulo em eventos como a Feira Plana.

A ideia de agregar editoras que possuem afinidades está no cerne desses lugares. No barco da Flipei (Festa Literária Pirata das Editoras Independentes), a pauta era dominada por temas políticos encarados pelo viés da esquerda e as discussões rolavam num inusitado e pequeno palco adaptado sobre a embarcação. "Foi melhor do que esperávamos. O pessoal está com mais desejo, mais fome de discutir política. Pelo momento que vivemos, há uma vontade de tomar partido, de realmente se posicionar", avalia Cauê S. Ameni, o responsável pelo local.

Ao todo, 13 editoras expuseram seus livros na Flipei. "O que É Racismo Estrutural" (Letramento), de Silvio Almeida, "Economia Para Poucos" (Autonomia Literária), organizado por Pedro Rossi, Esther Dweck e Ana Luíza Matos de Oliveira, e "Calibã e a Bruxa" (Elefante), de Silvia Federici, foram alguns dos títulos mais procurados pelo público que foi até o barco.

Casa Insubmissa de Mulheres Negras.

Já a Casa Fantástica nasceu graças a uma vaquinha virtual e levou a Paraty um lado da literatura que às vezes fica um tanto esquecido durante na Flip. "Não esperávamos que a literatura fantástica fosse ter toda essa repercussão por aqui, mas a casa vive cheia, com muitos jovens", contou Priscilla Lhacer, editora-chefe da Presságio e idealizadora e organizadora do espaço que ainda recebeu editoras como a Draco e a Aleph.

Quem destoou em partes nesse balanço foi Eduardo Lacerda, editor da Patuá e o principal responsável pela Casa do Desejo, provavelmente o espaço com o maior número de publicações de poesia na Flip. Apesar de estar positivamente surpreso com as vendas e a movimentação no casarão à beira da praia, diz que a convivência entre os colegas não foi das melhores: com pouca ajuda em um lugar que deveria primar pelo aspecto colaborativo, houve até discussões por pequenos espaços para a exposição dos livros. Além disso, mesmo com o sucesso junto ao público, a conta não deverá fechar para Lacerda, que projeta um prejuízo de aproximadamente R$30 mil.

Foi ainda na Casa do Desejo que aconteceu um dos episódios mais sérios desta Flip: a acusação de que José Luiz Goldfarb, acadêmico e ex-curador do Jabuti, tratou de maneira racista uma das pessoas que trabalhava no local. É simbólico que a editora homenageada desta edição da Festa seja justamente um bastião da cultura negra no país: a soteropolitana Corrupio, também uma referência histórica na cena independente.

Para centralizar as informações e permitir que o público tenha fácil acesso a boa parte disso que acontece em Paraty durante a Flip, a promessa da organização é que, para o ano que vem, todas as programações das casas parceiras estejam reunidas em um aplicativo para celular e em um telão, que será instalado na Praça da Matriz.

Viajei a Paraty a convite da EDP Brasil.

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Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.