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D. Levithan: Agora há um lugar na literatura para garotos beijando garotos

Rodrigo Casarin

08/08/2018 09h58

"Especialmente em nossos dias, quando somos bombardeados com tantas informações avulsas, acho que as histórias são essenciais para dar contexto a pensamentos e sentimentos, identidades e conflitos, experiências e tristezas. Não há nada que nos torne mais tolerantes do que realmente conhecer alguém diferente – não há melhor maneira de entender nossa humanidade do que compartilhar histórias. Em particular para os leitores LGBTQ +, se ver em uma história pode reafirmar sua própria identidade. E os leitores que não são LGBTQ + aprenderão o que temos em comum e poderão nutrir empatia a partir daí. A literatura pode transformar a sociedade? Certamente não por conta própria. Mas se pode definitivamente ajudar".

É nisso que acredita o escritor norte-americano David Levithan, publicado no Brasil pela Galera, um dos convidados deste ano da 25ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo, onde conversará com o público no sábado, dia 11. Se ontem trouxe uma reportagem sobre como aspectos sociais e políticos vêm aparecendo cada vez mais na literatura feita para jovens, Levithan pode ser visto como um exponente mundial dessa tendência. Seu "Will & Will – Um Nome, Um Destino", escrito em parceria com John Green e publicado em 2010, é tido como o primeiro romance young adult com protagonistas homossexuais a entrar para a lista dos mais vendidos do New York Times – a linha temática se repete, dentre outros, em "Garoto Encontra Garoto".

Já em "Todo Dia", best-seller que deu origem ao filme dirigido por Michael Sucsy, conta a história de A., personagem que a cada manhã desperta em um corpo diferente, assumindo características distintas, como o sexo. A ideia central de "Todo Dia" nasceu com algumas perguntas: como seria a nossa vida se não fôssemos definidos pelos nossos corpos? Como seria um personagem que, por mudar todos os dias, não fosse definido por raça, gênero ou pelos padrões de beleza? Como seria uma pessoa que se definisse apenas pelas suas ações e pensamentos?

"Foi fascinante explorar tudo isso. Queria que a mensagem desse livro fosse que cada um não é definido pelo seu corpo, mas pelo que está dentro dele. A humanidade de cada um está apoiada em seus corpos, mas não são os corpos que a definem", diz Levithan na entrevista que concedeu ao blog – na oportunidade que também mencionou as palavras que abrem este texto.

Em 2015, quando a Galera divulgou a arte da edição brasileira de "Dois Garotos se Beijando", outro dos mais de 20 livros de Levithan, muita gente se queixou nas redes sociais da capa, que trazia a imagem de dois meninos trocando um beijo – a mesma opção adotada em diversos países que lançaram a obra, vale ressaltar. Sobre a polêmica, o autor diz enxergar uma sociedade que está numa curva de aprendizado, com algumas pessoas levando mais tempo para se adaptarem à equidade e à igualdade do que outras.

"Essa capa de 'Dois Garotos se Beijando' foi muito importante para mim. É uma maneira de dizer a todos os leitores – gays e héteros – que, depois de verem milhares de capas com meninos beijando meninas, agora há um lugar nas prateleiras e em nossa literatura para garotos beijando garotos. Se isso causa desconforto em algumas pessoas, que assim seja. É muito, muito mais desconfortável passar toda uma vida sem se ver representado nas capas dos livros ou notando que sua história não é suficientemente importante para ser contada".

Levithan ainda comentou que, ao se deparar com seus livros sendo atacados por algumas pessoas, sente que na verdade a ofensiva se destina à sua identidade e à identidade dos colegas e amigos que se veem representados em sua obra. "Existe a incrível crença de que, se puderem nos apagar das estantes de livros, de alguma forma seremos apagados da sociedade. Então, respondo escrevendo e viajando mais, e sendo o mais retumbante possível", diz, para em seguida enfatizar: "As pessoas que pensam que podem apagar a gente, bem como nossos livros, não nos conhecem muito bem. Eles só nos fazem querer ainda mais criar representações de nós mesmos e de outras identidades sub-representadas".

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Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.