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Fantasiar sexo com defuntos já foi moda no Brasil e resultou até em morte

Rodrigo Casarin

13/10/2017 09h42

"A Dança da Vida", de Edvard Munch.

"Os sentimentos diante da morte, assim como o morrer, são fenômenos modelados pela cultura de uma época. No século 19, sexualidade e morte se aproximaram. Na pintura, a morte arrebatava donzelas com carinhos sensuais. Na escultura, belíssimos corpos femininos convidavam aos passantes a dormir com eles… para sempre. O teatro multiplicou cenas em cemitérios e túmulos. Contavam-se histórias sobre monges que copulavam com belas jovens e mortais. A então chamada 'galanteria' invadiu o além".

É o que escreve a Mary Del Priore em "Histórias da Gente Brasileira – Império", segundo de quatro volumes que estão sendo publicados pela Leya nos quais a historiadora narra pormenores do passado nacional. Em tempo de discussões e gritarias sobre a arte – na verdade, muito mais berros de ogros mesmo -, chama atenção esse trecho da obra no qual ela fala sobre costumes do século retrasado.

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"Outro tema era o da morbidez definida como gosto mais ou menos sinistro pelo espetáculo físico da morte. O corpo morto e nu se tornou objeto de curiosidade científica e de prazer mórbido. Ciência e arte se deram as mãos. O cadáver virou personagem de lições de anatomia na vida real e na pintura. As cores de sua decomposição – verdes e cinzas – iriam inspirar pintores famosos. Nos túmulos, belas mulheres nuas com vestes transparentes substituíam a tradicional imagem da caveira comida de vermes ou de anjos com os olhos virados para o céu. Agora, não se viam mais esqueletos, mas seios e nádegas suavemente cobertos. Nos cemitérios, lustres e enfeites era compostos por pequenos ossos", continua Mary.

"O Sepultamento de Átala", de Anne-Louis Girodet.

Segundo a historiadora, os principais interessados pelo assunto eram intelectuais e estudantes das primeiras faculdades de Direito que surgiam no país, em lugares como São Paulo e Recife. Vivendo longe da família, em repúblicas, inspiravam-se em nomes como o poeta inglês Lord Byron, cujo poema "Lara" foi traduzido para o português pelo professor Tibúrcio Antônio Craveiro, que, pela descrição, era um homem de hábitos particulares. Ele levava uma vida temperada por "orgias e bizarrices" e vivia numa casa "decorada com aparelhos de tortura, múmias e gravuras macabras", com paredes "borrifadas de sangue" e iluminada por "velas pretas e vermelhas, como as que os condenados do Santo Ofício empunhavam a caminho da fogueira".

Essa moda levou jovens a criarem sociedades que promoviam orgias inspiradas pelos versos macabros de Byron. Certa vez, no entanto, o que poderia ser visto como mau gosto se transformou em um crime. Rapazes contrataram uma prostituta e, contra sua vontade, colocaram-na em um caixão e a levaram para o cemitério. Quando chegaram ao lugar e retiraram o tampo que prendia a moça à estrutura de madeira, uma surpresa: ela estava morta. "A mulher morrera de terror", relata Mary. E o que aconteceu? "Abriu-se um inquérito, nunca solucionado, pois envolvia filhos de famílias influentes". Sim, a história extremamente incomum teve um final que nos soa habitual até hoje, e isso sim deveria ser combatido.

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Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.