Desde flatulência até depressão: autoras indicam livros para curar males
Rodrigo Casarin
16/12/2016 11h42
Está com flatulência? Leia "Uma Confraria de Tolos", de John Kennedy Toole. Você sentirá "uma grande sensação de camaradagem e solidariedade com o extremamente instruído, mas seriamente desleixado Ignatius J. Reilly", o herói de trinta anos do romance. O personagem é "atormentado por tantos problemas gastrointestinais calamitosos que vive inchando a proporções gigantescas e balançado de costas na cama" para tentar se libertar dos seus gases. Depois de acompanhar e se identificar com a trajetória de Ignatius, a indicação é que o flatulento também reveja seus hábitos e sua alimentação.
Pode parecer um tanto estranha, mas é essa a recomendação da escritora Susan Elderkin e da professora de artes Ella Berthoud, responsáveis pelo serviço de biblioterapia da The School Of Life de Londres, onde prescrevem livros para ajudar a tratar de diversos males sofridos pelos pacientes. Agora, um apanhado dessas prescrições feitas pela dupla foi lançado no Brasil pela Verus sob o título de "Farmácia Literária".
Mais de 400 livros são indicados para a vasta lista de problemas. Está mau humorado? Leia "A Ilha do Dr. Moreau", de H.G. Wells. Quer entender os hormônios da adolescência? "O Apanhador no Campo de Centeio", de J. D. Salinger. Sofrendo com o desemprego? "Crônica do Pássaro da Corda", de Haruki Murakami. Está com ejaculação precoce? "Pamela, ou a Virtude Recompensada", de Samuel Richardson. Gripado? "O Assassinato de Roger Ackroyd", de Agatha Christie. Deprimido? "A Insustentável Leveza do Ser", de Milan Kundera. Anda se sentindo um idiota? "O Idiota", de Fiodor Dostoiévski, é claro.
Ella e Susan explicam que uma das principais maneiras da literatura ajudar uma pessoa é fazer com que ela se sinta refletida em um personagem. "O romance tende a abordar aspectos da condição humana que nem sempre são fáceis de se tratar: solidão, sofrimento, traição, o significado da existência… À sua maneira, a literatura pode ser um analgésico, fazendo o leitor rir ou o distraindo", argumentam.
Livros para o banheiro e para fingir que é leitor
Apostando no bom humor, em "Farmácia Literária" as autoras também criam algumas listas bastante interessantes, como "os melhores livros para parecer ter cultura literária". Na visão das duas, as cinco obras essenciais para alguém ser um impostor de tal arte são: "O Morro dos Ventos Uivantes", de Emily Brontë, "O Grande Gatsby", de Scott Fitzgerald, "A Montanha Mágica", de Thomas Mann, "Moby Dick", de Herman Melville, e "Guerra e Paz", de Leon Tolstói.
Em outro momento, um clássico das listas: os melhores livros para ler no banheiro. Entram na relação nomes como Samuel Beckett ("Companhia"), Italo Calvino ("As Cidades Invisíveis"), J. M Coetzee ("Diário de um Ano Ruim") e Kurt Vonnegut ("Cama de Gato").
Para crianças
E há alguém a quem a biblioterapia possa ser mais recomendada? Segundo Ella e Susan, o método funciona especialmente bem com crianças, principalmente quando usado para ajudar os pequenos a crescer e lidar com questões difíceis. "Uma criança que perde o avô ou está sendo intimidada na escola precisa saber que não é a única a passar por isso e que há maneiras para que lide com a angústia. Muitas pessoas usam biblioterapia em seus filhos, mas sem chamá-la dessa maneira", dizem. "Literatura pode curar, oferecendo uma pequena dose da doença, como um remédio homeopático. Assim, a dor do amor, por exemplo, pode ser experimentada na leitura", completam.
Sobre o autor
Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.
Sobre o blog
O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.