Machado de Assis é o maior humorista brasileiro da história, diz estudioso
Rodrigo Casarin
03/08/2016 14h47
"Creio que não seria polêmico afirmar ser ele o maior humorista brasileiro de todos os tempos", aponta Flávio Moreira da Costa, o organizador da antologia "O Melhor do Humor Brasileiro", recém-lançada pela Companhia das Letras, em determinado momento do livro. "Ele", no caso, é Machado de Assis, o autor mais citado no volume, nome amplamente reconhecido pelo humor fino e olhar irônico e sagaz.
"O Melhor do Humor Brasileiro" reúne desde relatos e poemas anônimos que datam de antes dos portugueses colocarem os pés por aqui, passando por trechos de romances clássicos de nossas letras e até escritos de autores contemporâneos. O foco é claro: encontrar nos registros o olhar crítico, irônico e gozador dos artistas em questão. "A quantidade de material encontrado e o humor dos índios, que é um campo ainda a ser pesquisado, pois só dei uma pequena amostra dele", diz Flávio sobre os aspectos que mais lhe surpreenderam durante os cinco anos de pesquisa para organizar o volume.
A obra começa registrando um canto canibal de índios tupinambás que viviam em torno da baía de Guanabara e passa por outros registros da cultura indígena e do relato popular até chegar em Gregório de Matos (nasceu em 1636, morreu em 1696), o primeiro autor a aparecer no volume e que Flávio define como "abusado" e "irreverente". É dele, por exemplo, o seguinte verso: "Não é fácil viver entre os insanos,/ Erra, quem presumir que sabe tudo,/ Se o atalho não soube dos seus danos./ O prudente varão há de ser mudo,/ Que é melhor neste mundo, mar de enganos,/ Ser louco c'os demais, que só, sisudo".
Ao comentar a obra, Flávio explica que há uma enorme variedade nas características do humor feito pelos autores brasileiros. "Pode haver semelhanças aqui e ali, mas respeitei as individualidades, como seria de se esperar". O antologista, aliás, sequer acredita que exista algum tipo de comicidade inerente ao fato dos escritores estudados terem nascidos no mesmo país – ou território, já que parte dos textos datam de antes da ideia de Brasil ter sido concebida. "Sou rebelde a esse tipo de definição. Não acredito em humores nacionais. O humor é uma característica do ser humano".
Flávio optou por dividir a obra em quatro recortes históricos (humores iniciais, coloniais, imperiais e republicanos) e explica que o critério para escolher os textos que entrariam no volume foi essencialmente a qualidade e a representatividade. "Faço antologias há décadas e fiz várias de humor. Fui crítico muito tempo e acho que isso e os trabalhos anteriores me dão crédito para que eu perceba a qualidade deste ou daquele texto", diz ele, que já organizou 30 reuniões do tipo, como "Os Cem Melhores Contos de Humor da Literatura Universal" e "Os Melhores Contos da América Latina".
Dentre os autores contemporâneos que passaram pelo crivo do organizador estão Carlos Heitor Cony, Luis Fernando Verissimo e Antonio Prata, nome mais novo do livro, de quem registra a crônica "Gênesis, revisto e ampliado", na qual o escritor repassa a história de Adão e Eva. "Como a antologia tem um viés histórico, isto é, começa lá atrás com os índios e a cultura popular, e atravessa séculos, tinha de acabar em um valor novo, que eu julguei ser o Antonio Prata. Poderia ser outro? Sim, mas eu tinha de escolher", explica Flávio.
E, voltando ao começo da matéria, se o volume de material encontrado por Flávio foi grande, ele já prepara um segundo volume da obra? Não. "Daria uma outra antologia, que, aliás, não pretendo fazer", antecipa o estudioso.
Sobre o autor
Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.
Sobre o blog
O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.