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No Dia Mundial do Livro, lembremos de Eco: "Não contem com o fim do livro"

Rodrigo Casarin

23/04/2020 16h35

"Como é belo um livro, que foi pensado para ser tomado nas mãos, até na cama, até num barco, até onde não existem tomadas elétricas, até onde e quando qualquer bateria se descarregou, e suporta marcadores e cantos dobrados, e pode ser derrubado no chão ou abandonado sobre o peito ou sobre os joelhos quando a gente cai no sono, e fica no bolso, e se consome, registra a intensidade, a assiduidade ou a regularidade das nossas leituras, e nos recorda (se parecer muito fresco ou insonso) que ainda não o lemos….".

As palavras acima foram escritas por Umberto Eco, certamente um dos maiores apaixonados por livros que já tivemos neste planeta. Elas compõem o ensaio "Reflexões Sobre a Bibliofilia", publicado originalmente em 2001 como um folhetim pela Edizioni Rovello e reeditado como uma das peças de "A Memória Vegetal E Outros Escritos Sobre Bibliofilia", publicado aqui no Brasil pela Record em 2010.

Hoje é o Dia Internacional do Livro, uma homenagem a nomes como William Shakespeare e Miguel de Cervantes, que teriam nos deixado nesse dia, só que em 1616. Não é verdade. Cervantes morreu antes, Shakespeare vivia numa Inglaterra que seguia o calendário juliano, o que causa uma bagunça nas datas, mas isso é papo para outra hora (ou para outra aba do navegador, caso não possa esperar). Não quero azedar a festa de ninguém com preciosismos históricos. Voltemos ao amor aos livros.

Por aqui, todo dia é dia de festejar esse objeto venerado por mim, por Eco e por tantos outros, por isso que às vezes fico pensando no que escrever numa data específica como esta. Os livros que ditam os rumos de boa parte da minha vida.

Mas lembro que estamos num momento particularmente difícil. Se listas com sugestões de leitura para a quarentena pipocam em tudo o que é canto, por outro lado vemos notícias de livrarias fechando e de bancos dificultando o acesso de empresas do setor a empréstimos. O mercado editorial está ruindo, alardeiam. Sim, há problemas. Muitos problemas. Mas todos esses problemas dizem muito mais respeito às planilhas de Excel do que às páginas impressas. O modelo de muitos negócios relacionados ao livro precisam ser repensados, não há dúvidas, mas isso não quer dizer que estamos à beira de um mundo sem livros, como pintam por aí.

Os leitores existem, e são muitos. Certo, nem tantos assim se compararmos com a quantidade de não leitores, mas suficientes para justificar a impressão de centenas, milhares de livros, ainda que em pequenas edições. O livro conta com um trunfo raro de se encontrar em outras áreas: há paixão legítima envolvida, há amor verdadeiro por esses montes de folhas com letras impressas amarradas por uma linha e coladas numa capa bonita.

O momento é difícil, mas voltemos a Umberto Eco para lembrar do nome de um outro trabalho do italiano: "Não contem com o fim do livro".

E boa leitura a todos!

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Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.