Crise de abstinência? Três livros certeiros para não perder o ritmo da Copa
No primeiro dia, 90 minutos para dar o gosto do que vem a seguir. Depois, uma sequência divina: 14 dias com três ou quatro partidas. Uma folga estranha. Outra batelada de quatro dias, dois duelos eliminatórios a cada 24 horas. Pausa de dois dias, outros jogos decisivos e cá estamos, ociosos, esperando pelas últimas partidas da Copa. É uma tristeza. Terceiro lugar no sábado, final no domingo e… as trevas (ou o Brasileirão).
Conforme a Copa passa, vamos do entusiasmo dos duelos diários para a crise de abstinência que hoje assombra a todos. Lembrar que em menos de 100 horas não teremos mais mundial é desolador. Enquanto esse triste momento não chega, deixo aqui três dicas certeiras de leitura para quem não deseja perder o ritmo do que estamos vendo na Rússia:
"Maracanazo e Outras Histórias", de Arthur Dapieve (Alfaguara): nessa reunião de cinco contos, brilha o que dá nome ao volume: "Maracanazo" é uma pérola de nossa literatura. E não, não estamos falando de uma ficção baseada na final contra o Uruguai, mas das traulitadas que a Espanha sofreu no Maraca: 6X1 para o Brasil na Copa de 1950, 3X0 para o Brasil na Copa das Confederações de 2013 e 2X0 para o Chile na Copa de 2014. É nesta partida que um espanhol e uma chilena se conhecem e engrenam um flerte que servirá de base para o embate de ideias – e não só ideias – entre uma entusiasta de Victor Jara, músico preso durante a ditadura do Chile, que teve suas mãos esmagadas antes de ser fuzilado, e um conservador que abraça a direita e tem certa queda pelo fascismo.
"Páginas Sem Glória", de Sérgio Sant'Anna (Companhia das Letras): reunião de contos no qual o texto de destaque (uma novela, na verdade) também dá nome ao livro e fala sobre futebol. Na narrativa, Sérgio – um dos grandes escritores de nossos dias e uma das principais atrações da Flip deste ano – apresenta ao leitor José Augusto do Prado Fonseca, o Conde, jogador bom de bola que é descoberto no futebol de areia e ganha uma chance no Fluminense. No entanto, mais preocupado em se divertir do que em levar o jogo a sério, a carreira do craque toma um rumo bem aquém do imaginado. "Pensei na beleza e na graça do lance. Não é para isso que as pessoas vão ao futebol? Para ver o espetáculo?", diz o boleiro após um lance crucial de sua jornada, em uma espécie de resumo de sua personalidade.
"Entre as Quatro Linhas" (Dsop): organizada por Luiz Ruffato e publicada às vésperas da Copa de 2014, esta coletânea reúne um respeitável time de autores brasileiros se debruçando sobre o futebol: Fernando Bonassi, Ronaldo Correira de Brito, Flávio Carneiro, André de Leones, Tatiana Salem Levy, Adriana Lisboa, Ana Paula Maia, Marcelo Moutinho, Carola Saavedra, Cristovão Tezza… Li quando o livro saiu e uma narrativa que permanece vívida em minha memória é "Raimundo, o Dono da Bola", de Eliane Brum. No texto, Eliane nos apresenta Raimundo, um sertanejo que cresceu no meio da floresta e conhece o futebol somente pelo que ouve no rádio (como nunca viu nenhuma partida, para ele o esporte é a ficção que cria em sua cabeça graças às palavras dos radialistas). Quando Valdir aparece na vida de Raimundo, leva para ele não só conceitos da cidade, mas também o futebol do plano real: traves, bola… A partir desse encontro que se dá uma narrativa sobre diversas formas de violência.
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