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1711: o ano em que o Rio de Janeiro foi sequestrado por piratas franceses

Rodrigo Casarin

25/08/2017 09h41

As autoridades portuguesas que administravam o Rio de Janeiro já tinham sido informadas de que uma frota francesa estava prestes a atacar a cidade. Isso, no entanto, não foi suficiente para que tivessem uma defesa minimamente adequada. No dia 12 de setembro de 1711, quando René Duguay-Trouin despontou com seus 18 navios e quase 6 mil homens, a tentativa de proteger território brasileiro beirou o ridículo. Gente importante não tomou seu posto por falta de transporte, munições caiam uma sobre as outras e, quando a frustração já era iminente, navios foram queimados para que os invasores não tomassem as embarcações.

Há algum tempo que Duguay-Trouin, um corsário que fazia seus ataques e saques sob respaldo do governo e de abastados franceses – um pirata oficial, digamos assim -, andava de olho nas riquezas que Portugal levava do Brasil para a Europa. Após algumas tentativas fracassadas de roubar as embarcações repletas de preciosidades, resolveu atacar logo a cidade onde a frota lusitana era carregada.

No ano anterior, uma ofensiva francesa tentara invadir o Rio pela Baía de Guanabara, mas fora repelida. Com algumas lições aprendidas, Duguay-Trouin rondou o lugar por mais de uma semana até que os ventos se tornassem favoráveis para que rompesse a defesa brasileira com velocidade suficiente para pegar a todos de surpresa. Não que fosse necessário. Um dia antes do ataque, o governador local havia abaixado a guarda, achando que as informações a respeito de Duguay-Trouin e sua frota não passavam de boatos, o que contribuiu bastante para o atabalhoamento defensivo.

Após o sucesso da invasão, os franceses tomaram a Ilha das Cobras e seguiram ocupando território carioca sem encontrar grande resistência. Ao longo da semana, bombardearam a terra alvejada e realizaram pequenos ataques ao apático exército local. "O corsário tomou a cidade, anunciou o sequestro de toda a população e exigiu um resgate de 610 mil cruzados, 100 caixas de açúcar e 200 bois para não destruir completamente o Rio", escreve o historiador Luiz Antonio Simas em "A Cidade Sequestrada", um dos textos presentes no livro "Coisas Nossas" (José Olympio), onde li sobre essa passagem pela primeira vez.

Um esboço do plano de invasão dos piratas.

Contra problemas, aumento de impostos

Autoridades tinham dito que defenderiam o Rio até a última gota de sangue e que executariam quem abandonasse seus postos, mas essas mesmas autoridades se acovardaram assim que viram o poder dos franceses. Diante do caos instalado, enquanto a cidade era saqueada e parte da população – e dos políticos – fugia assustada, outra se juntava para tentar encontrar alguma solução.

"O governador simplesmente fugiu, acompanhado pelas principais autoridades municipais. Coube ao povo carioca se virar para resolver a escaramuça. Após uma vaquinha épica, cada um doando o que tinha para completar o butim, o francês recebeu o resgate e voltou para a Europa. Parece que a noite anterior à partida foi um negócio sério. A francesada encheu o pote nas tabernas mais suspeitas da Guanabara e teve até pirata que se enamorou e resolveu por aqui ficar", continua Simas. Essa saída de Duguay-Trouin aconteceu no dia 13 de novembro. Com os navios repletos de grana e produtos dos mais diversos, levavam para a França uma pilhagem cujos rendimentos resultariam em mais de 90% de lucro sobre o que foi investido para a ação – e olha que esse tipo de ataque exigia muitos recursos.

Francisco de Castro Moraes, o governador do Rio na época, logo foi considerado culpado por tudo o que aconteceu no território pelo qual deveria zelar. "O povo da cidade, cuja moral tinha ficado elevada após a vitória conseguida sobre os corsários franceses, em 1710, foi nesta outra invasão submetido à humilhação da derrota. A facilidade com que a cidade foi invadida gerou na população a necessidade de eleger um culpado. O eleito foi o governador, acusado de covarde. Com a eleição do culpado, um velho hábito, o povo encerrava o problema. Desta forma, o rei não precisaria fazer uma análise pública da situação e o consequente comprometimento com a busca de soluções. O fato ganhou uma versão oficial, na qual a fácil invasão passou a ser justificada não pela incompetência do sistema de defesa da cidade, mas sim como uma fatalidade, criada por uma forte neblina matinal, que facilitou ao invasor se aproximar da barra sem ser visto", escrevem os pesquisadores Ricardo Vieira Martins e Carlos Alberto Lombardi Filgueiras no artigo "A Invasão Francesa ao Rio de Janeiro Sob a Análise da Cartografia Histórica".

Também consta contra Francisco que ele teria ajudado os franceses a negociar bens roubados com os habitantes do Rio quando os navios já estavam abarrotados. Ou seja, os piratas revendiam os produtos para aqueles que tinham sido assaltados, e tudo isso com o auxílio do governador local. Não bastasse, após a ação dos corsários, a saída encontrada pelos portugueses para reedificar a cidade foi uma familiar para os brasileiros até os dias de hoje: aumentar os impostos.

Passados mais de 300 anos, pouca coisa mudou.

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Em tempo, um livro interessante sobre o assunto é "Piratas no Brasil – As Incríveis Histórias dos Ladrões dos Mares que Pilharam Nosso Litoral", de Jean Marcel Carvalho França e Sheila Hue, publicado pela Editora Globo.

Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.