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Cinco fatos que fizeram de Ferreira Gullar um grande intelectual e poeta

Rodrigo Casarin

04/12/2016 15h57

 

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Ferreira Gullar. Difícil encontrar alguém que nunca tenho ouvido falar do poeta que morreu hoje, aos 86 anos, após ficar cerca de 20 dias internado em um hospital do Rio de Janeiro com insuficiência respiratória. No entanto, é bastante comum que as pessoas conheçam seu nome, mas não tenham familiaridade com a obra do artista. É aquela famosa posição de "sei quem era, sei que era importante, mas não lembro de já ter lido algo dele". Eis aqui, então, um resumo dos motivos que levaram Gullar a ser tratado como grande escritor e intelectual:

"Poema Sujo": escrito pelo autor enquanto estava exilado na Argentina e publicado em 1976, "Poema Sujo" se tornou o seu trabalho mais conhecido e celebrado. Com diversas passagens de extremo erotismo, a obra trata da repressão política que intimidava muitos brasileiros, dentre eles o próprio Gullar. Uma das motivações para escrever o texto foi deixar um testemunho final antes que o calassem para sempre.

Linguagem: Gullar foi um dos responsáveis por revolucionar a poesia ao romper com os habituais versos e dar uma maior flexibilidade à linguagem. Passou, então, a trabalhar com a palavra de forma bastante livre, sendo que o formato dos poemas também se tornou um aspecto importante da arte. Veja um exemplo:

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Música: a poesia de Gullar influenciou diretamente músicos do tropicalismo e o próprio escritor se dedicou a compor canções populares durante parte de sua carreira. Assina com Caetano Veloso, por exemplo, "Onde Andarás", e com Milton Nascimento, "Bela Bela". É também um dos responsáveis pela tradução da letra de "Borbulhas de Amor" – sim, aquela do "Quem dera ser um peixe…" -, um dos maiores sucessos de Fagner, versão de uma canção do dominicano Juan Luis Guerra.

Teoria e crítica: não bastasse ser um artista respeitável, Gullar se dedicou sobremaneira a pensar a própria arte. Dentre seus trabalhos críticos e teóricos, destacam-se "Teoria do Não Objeto", de 1959, no qual defende que a arte só atinge o patamar de arte quando encontra algum espectador, e "Argumentação Contra a Morte da Arte", uma reunião de ensaios sobre elementos, principalmente mercadológicos, que ameaçam a produção contemporânea.

Independência intelectual: Gullar foi membro do Partido Comunista, temeu ser morto pelos militares ao longo da ditadura no país e viveu durante anos no exílio. Entretanto, na fase final de sua vida, comprou brigas, assumiu posições polêmicas e passou a ser visto por muitos como um reacionário. Bateu nos governos do PT desde os primeiros anos de Lula no poder e assumia uma posição bastante conservadora quando falava sobre a regulamentação ou descriminalização da maconha, por exemplo. Mesmo desagradando muita gente, principalmente colegas do meio intelectual e artístico, demonstrou ter uma postura bastante independente, algo cada vez mais raro em nossos dias.

Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.