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Livro sobre “histórias secretas” da Playboy é só um museu do jornalismo

Rodrigo Casarin

22/07/2016 09h00

 

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"Histórias Secretas", livro recém-lançado pela Panda Books, chega com uma proposta que pode atiçar a curiosidade de muitos leitores: revelar os bastidores dos 40 anos da Playboy no Brasil. Na capa da obra, uma fechadura desenhada dentro da letra "o" da palavra "histórias" dá a entender que pelas páginas poderemos espiar o que acontecia de mais sigiloso pelas salas da editora Abril enquanto a revista masculina era produzida. Quem espera por grandes revelações sobre belas mulheres e histórias apimentadas, no entanto, se desaponta. "Histórias Secretas" nada mais é do que relatos de homens como Juca Kfouri, Ruy Castro, Humberto Werneck e Sérgio Xavier, que falam basicamente sobre jornalismo.

histprias secretas[Ao todo são 15 profissionais que, além de se bajularem mutuamente, escrevem sobre as experiências que viveram enquanto trabalharam na publicação; o que é apresentado ao público acaba sendo uma espécie de museu da profissão. Boa parte dos textos lembra de uma época na qual havia dinheiro para se investir em pautas elaboradas, que poderiam levar meses para serem apuradas e elaboradas. Enquanto a curiosidade pelas beldades das capas seguravam as vendas das revistas, muito podia ser investido em longas matérias e entrevistas.

Conforme os relatos vão avançando, no entanto, o tom se torna cada vez mais desesperado. O apuro com o conteúdo diminui e o que temos são profissionais preocupados quase que exclusivamente com as cifras de cada edição da revista poderia render – ou desfalcar – aos cofres da Abril. "Nos sete anos em que estive à frente da publicação, todas as reuniões de planejamento começavam e terminavam com a mesma questão: 'Quem é a capa e quanto ela custa?'. Discussões editoriais foram raras", revela, por exemplo, Edson Aran, que comandou a revista entre 2006 e 2013.

É ele que também fala sobre o clima nefasto da empresa que foi casa da publicação até o final do ano passado, quando deixaram de publicar a Playboy, que logo em seguida passou a sair pela PBB Entertainment. "A editora [Abril] sempre foi uma 'fogueira das vaidades'. Cascas de banana, 'frituras' e sabotagens faziam parte do dia a dia", conta Aran.

Claro que há também algumas histórias interessantes, como o relato extremamente detalhado de Ricardo Setti sobre a tentativa frustrada de colocar Alina Fernández Revuelta, a única filha do ditador cubano Fidel Castro, na capa da revista. Também vale destacar o texto de Marcelo Duarte, no qual lembra a apuração para uma reportagem nunca publicada sobre a maneira que agências de prostituição utilizavam mulheres que saíram na Playboy – Alice de Carli e Claudia Raia, por exemplo – como chamariz de clientes (veja aqui algumas outras histórias).

Em diversas oportunidades, no entanto, os próprios jornalistas assumem que trabalhar na Playboy era algo muito diferente do que o imaginário popular supunha. Belas mulheres só estavam mesmo nas páginas da revista, não desfilando pelas redações – ali o que imperava era o trabalho jornalístico que poderia ser encontrado em qualquer lugar onde uma revista de qualidade fosse feita. Mostrando essa realidade, "Histórias Secretas" acaba sendo um livro interessante para estudantes de jornalismo, talvez, mas que tem pouco a dizer aos fãs da revista, principalmente àqueles que se tornaram fãs por conta das mulheres presentes em cada edição, sem dúvidas a imensa maioria.

Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.