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Escola atacada no Rio de Janeiro recebe “Poemaço” como resposta à violência

Rodrigo Casarin

02/06/2016 11h46

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Os últimos dias foram um tanto conturbados pelos lados da Praça Seca, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Por lá que uma garota de 16 anos foi estuprada por mais de 30 homens na semana passada. Antes disso, a escola municipal Carlos Drummond de Andrade havia sido invadida por bandidos que depredaram o lugar e roubaram computadores, projetores e até mesmo comida. Como uma resposta possível à violência, cinco escritores estiveram ontem no colégio com nome de poeta para realizar o que batizaram de Poemaço.

Henrique Rodrigues, o idealizador do Poemaço.

Henrique Rodrigues, o idealizador do Poemaço.

"A ideia veio logo que soube da depredação da escola, isso mexeu muito comigo porque eu estudei lá, foi lá que ganhei um concurso de frases e decidi ser escritor, volto lá todos os anos para dar palestras. Então, entrei em contato com os professores e comecei a organizar a ação", conta Henrique Rodrigues, autor, dentre outros, de "O Próximo da Fila". Logo quatro colegas toparam lhe acompanhar naquela proposta de diálogo e poesia para combater a barbárie: Écio Salles, idealizador da Flupp (Festa Literária das UPPs), Flávia Cortês, autora de diversos livros infantis, a poeta Letícia Brito e Otávio César Júnior, autor de "O Livreiro do Alemão".

Na escola, reuniram-se com algumas centenas de estudantes na quadra, onde falaram um pouco de suas trajetórias: os cinco nasceram em periferias e cresceram em uma realidade na qual ser escritor soava praticamente como uma utopia. O próprio Henrique, por exemplo, lembrou que quando estudava na Carlos Drummond de Andrade, ainda na década de 80, perdeu um colega morto por um tiro, uma amostra de que os problemas lamentavelmente persistem. Claro, também leram textos próprios e alguns poemas. Em seguida, almoçaram com os alunos no refeitório e depois se dividiram em cinco turmas, que realizaram oficinas comandadas pelos autores.

"Todo mundo sabe que a escola tem que melhorar, voltar a ser o que era nos tempos áureos e a literatura talvez seja uma forma interessante de transmitir essa mensagem, isso dentro do campo simbólico. Os cinco autores que foram lá têm linhas diferentes de trabalho, mas todos enfrentaram dificuldades para entrar na vida literária. Essa mensagem também é importante de transmitir. A coisa está difícil, mas a gente vai tocando o barco e vai lutando", relata o idealizador do Poemaço.

O resultado dessa mobilização? "As pessoas ficaram muito sensibilizadas, inclusive professores e diretores, teve até choradeira. A escola se sente cada vez mais abandonada, primeiro pelo poder público, depois pelos pais e pelos próprios alunos", conta Henrique. Para ele, uma ressignificação do que aquele espaço representa é a principal consequência de ações como o Poemaço. "A escola é o principal local para a mudança e melhoria da sociedade, não tem outro lugar que chegue perto. Esse tipo de atitude pode ajudar a despertar no aluno a conscientização de que a escola também pertence a ele. Que quando um deles rouba a escola, está roubando ele mesmo e o colega do lado", argumenta.

E, na visão do autor, que se diz "saturado de ver gente pseudomobilizada", esse tipo de ação, principalmente se encampada por mais pessoas, é que pode ajudar a melhorar a realidade. "O Facebook está cheio de ativista virtual, mas isso não é um ativista, é um papagaio. É preciso olhar um pouco mais para o que está ao nosso alcance. Vai lá, vê o que tá acontecendo na escola pública onde estudou, ou na que tem perto de casa, conversa com os alunos, dá uma palestra, uma oficina, faz um show… as escolas recebem muito bem isso".

Vejam mais imagens do Poemaço:

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Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.