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Momento do Brasil é “vergonhoso”, diz escritor Luis Fernando Veríssimo

Rodrigo Casarin

15/12/2015 10h09

verissimo

Aos 79 anos, Luis Fernando Veríssimo é um dos escritores mais admirados do país. Autor de mais de 60 livros – "O Analista de Bagé", "Comédias da Vida privada" e "Borges e os Orangotangos Eternos", por exemplo, apenas para citar alguns dos mais famosos – e colunista de jornais como "O Globo", "O Estado de São Paulo" e "Zero Hora", lançou recentemente a coletânea de contos "As Mentiras que as Mulheres Contam", na qual apresenta 48 histórias breves inspiradas em inverdades – ou omissões, desculpas, fingimentos… – contadas por moças de diversas idades. A obra pode ser vista como uma resposta do próprio Veríssimo ao seu best-seller "As Mentiras que os Homens Contam", de 2000, que vendeu mais de 500 mil exemplares.

A primeira mentira que o autor apresenta no novo livro é o famoso "Olha o aviãozinho", normalmente contada para que crianças abram a boca e engulam sua papinha. Contudo, na entrevista a seguir – concedida por e-mail, para tentar driblas sua famosa timidez -, Veríssimo diz que enganações de "mãe estão perdoadas". Mas algumas outras são mais difíceis de aceitar. Apesar de tolerante, confessa que às vezes não dá para aguentar quando elas dizem que "falta só um minutinho para ficarem prontas, e ainda demoram meia hora".

mentiras que elas contamO autor também falou um pouco sobre a vida – lamenta que a saúde não permita que continue a comer igual fazia em outros tempos – e comentou o atual momento do país ("Só uma palavra descreve o Brasil, hoje: vergonhoso").Quando perguntado quais são as maiores mentiras que os próprios brasileiros, principalmente os "homens comuns", contam, lembrou que "As mentiras que mais se ouvem não são de homens comuns, são de homens incomuns tentando explicar a conta na Suíça", uma clara alusão ao deputado federal Eduardo Cunha.

"Todas as mentiras que elas nos contam são desdobramentos daquela arquetípica, da nossa própria mãe", você escreve em um dos contos, referindo-se ao "aviãozinho" que, na verdade, nada mais é do que uma colher de papinha. Os homens sempre nascem fadados a ter que conviver com as mentiras das mulheres, então?

As mentiras de mãe pelo menos eram para o nosso bem. O aviãozinho era para nos fazer abrir a boca. O "Come Feio" era para nos ensinar a ter modos na mesa, etc. Depois as mentiras ficaram mais sérias. Mas as de mãe estão perdoadas.

Você aproveitou esse livro para, de alguma forma, vingar-se das mentiras que já escutou de mulheres?

Não. Na verdade, poucos textos do livro são especificamente sobre mentiras de mulheres. Acho até que a maioria é sobre pecados masculinos.

Aliás, quais as mentiras femininas que você ouviu que mais lhe doeram ao longo da vida?

Não chega a doer, mas não dá para aguentar quando elas dizem que falta só um minutinho para ficarem prontas, e ainda demoram meia hora.

A comida tem um papel central em alguns contos, seja na forma de uma sobremesa bem feita ou de um simples misto-frio. Comer continua sendo um de seus maiores prazeres? Por que levar esse prazer recorrentemente à literatura?

Hoje escrevo sobre comida de memória. Não posso mais comer como antigamente. Problemas de saúde. Ficou só a literatura.

 

Repassando a sua obra, o que lhe dá mais orgulho de ter feito? Há algo que, hoje, você olha e sente que não deveria ter publicado?

Não é exatamente orgulho, mas gostei de fazer o romance "Borges e os Orangotangos Eternos". Já a experiência de ler alguma coisa escrita há tempo e pensar "Como é que eu fui fazer uma bobagem dessas?" é comum.

Você sempre se posicionou firme quando perguntado sobre política. Qual a sua avaliação para o momento que o país vive?

Só uma palavra descreve o momento do Brasil, hoje: vergonhoso.

Nessa linha, quais são as maiores mentiras que os próprios brasileiros, principalmente os "homens comuns", contam?

As mentiras que mais se ouvem não são de homens comuns, são de homens incomuns tentando explicar a conta na Suíça.

Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.