Em Paris, Luiz Ruffato, Paulo Lins e Marcelino Freire fazem mesa política
Com a temática de como o Brasil é representado nos romances, a conversa no Salão de Paris entre os escritores Marcelino Freire, Luiz Ruffato e Paulo Lins, mediada por Saulo Neiva, professor universitário e pesquisador, foi profundamente marcada por assuntos políticos e acompanhada por um público de mais de cem pessoas, que lotou o espaço reservado para a mesa.
Lins iniciou as falas dizendo que "Desde que o Samba é Samba", seu livro mais recente, sobre as origens do samba e as dificuldades enfrentadas pelo gênero, retrata a continuação da guerra travada contra os negros no Brasil após a escravidão ter sido abolida. "A cultura é arma de guerra. Quando um povo quer dominar o outro, acaba com sua cultura e com seu deus". Exemplificando, citou os países caribenhos dominados outrora pela França, que, apesar da imensa população negra, possuem pouco da cultura africana.
Em seguida, disse que ex-escravos se tornaram marginais após a liberdade por conta da falta de oportunidades, principalmente de emprego, e é essa a origem de bandidos como Zé Pequeno, seu icônico personagem de "Cidade de Deus". Lembrou ainda que a violência que existe no Brasil e em outros países do mundo é em muito causada por armas que vêm da Europa e dos Estados Unidos, quase sempre de forma ilegal, crime pouco divulgado e combatido. Afirmou, por fim, que está trabalhando junto com o escritor e cineasta mexicano Guillermo Arriaga em um filme sobre o tráfico de armas na América do Sul.
Ruffato, por sua vez, ressaltou que os três escritores ali presentes voltam suas atenções para questões antes pouco retratadas na literatura brasileira: Lins com relação aos marginalizados, sobretudo negros, Freire por apresentar "um nordeste que não é rural, em pé de igualdade com outras regiões do país" e ele mesmo por procurar representar a classe média baixa.
Muito lembrado por seu discurso na abertura da Feira de Frankfurt de 2013, que também contou com o Brasil como homenageado, quando fez duras críticas ao país, o autor de "Eles Eram Muitos Cavalos" pontuou que, como seus pares ali presentes, aposta em seu olhar severo para edificar algo. "Por mais esquisito que pareça, nós amamos o Brasil. Somos otimistas, apontamos problemas, colocamos em cheque o país que temos para que ele possa melhorar. Por mais que seja até utópico, acredito piamente nisso, se não, não escreveria, iria fazer outra coisa".
Já Marcelino apostou no humor para lembrar da falta de água em São Paulo. "Sou do sertão de Pernambuco e minha família saiu de lá porque não tinha água. Vim de São Paulo, que só tem 15% de suas reservas, para cá achando que iria beber água. Aí chego na mesa e só tem esse restinho?", brincou, ao queixar-se da única água presente no lugar ter sido a que pouco sobrara da conversa anterior. Sobre seu romance "Nossos Ossos", voltou a arrancar algumas risadas da plateia ao considerá-lo não autobiográfico, mas "autopornográfico".
Em Paris, para a cobertura do Salão do Livro, Rodrigo Casarin está hospedado a convite da rede Accor.
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