Topo

Admira Francisco de Assis? Conheça a história do santo contada por um Nobel

Rodrigo Casarin

27/11/2019 08h49

Em 1946, Herman Hesse, um dos maiores nomes da literatura de língua alemã, levou o Nobel por conta de textos profundos, audaciosos e de ótimo estilo, que servem de exemplo para os ideais humanitários clássicos. Autor que já vendeu mais de 500 mil exemplares por aqui, responsável por títulos famosos marcados pelo teor filosófico, como "Sidarta" e "O Lobo da Estepe", além de "Demian", lançado logo após a Primeira Guerra Mundial e no qual se posicionou contra o militarismo germânico, há poucas semanas uma obra de Hesse que eu não conhecia caiu em minhas mãos.

Falo de "Francisco de Assis", publicado pela Record com tradução de Kristina Michahelles, texto de apoio de Fritz Wagner e ilustrado com reproduções de afrescos de Giotto, que, se não fazem muito o meu tipo, inegavelmente servem bem para ilustrar a história do santo. A obra é uma tentativa de biografar o homem que viveu entre os séculos 12 e 13 e se tornou um sinônimo de paz, humildade e entrega ao próximo dentro da Igreja Católica – virtudes que faltaram e muitas vezes ainda faltam à própria instituição. Se Hesse levou um Nobel pelo valor humanitário da obra que compôs, não surpreende seu interesse por uma figura como Francisco.

Percorrendo uma trilha de fontes tanto escassas quanto pouco confiáveis, Hesse entrega um texto breve, definido como uma mistura de lenda, ensaio e fábula, que apresenta pinceladas sobre a trajetória do santo frequentemente associado ao trato que dispensava aos animais. É o suficiente para que saibamos que Francisco veio ao mundo enquanto o pau quebrava na Idade Média, com imperadores, papas e demais homens da Igreja ou teoricamente dela devotos dando de ombros para os ensinamentos de Jesus. "A Igreja Romana, senhora do mundo, cuidava mais ciosamente de armamentos, alianças e legações, exílios e punições do que da paz das almas. Entre os povos amedrontados surgiu uma profunda miséria", aponta o autor.

Francisco não desponta como um milagre. Nasce numa família de posses, repercute durante algum tempo os preconceitos herdados de seus pais, mas aos poucos vai se desapegando do que é mundano. Na busca por uma vida essencialmente espiritual e na qual se dedicaria a, basicamente, fazer o bem, rompe com a própria família, é humilhado por amigos e precisa descobrir o caminho a trilhar, processo no qual garante ter encontrado auxílio divino. Previsivelmente, ao longo dessas etapas, é mesmo difícil não pensar no quanto de lenda há ao redor de sua história. Não devemos nos apegar tanto aos fatos, no entanto. Como qualquer mito, o valor simbólico é o que mais importa.

Ao cabo, é bonita a exaltação que Hesse faz a Francisco a partir do único registro autoral deixado pelo homem santificado. "Se alguém me perguntasse 'mas como pode chamar aquele Francisco de grande poeta, se ele não nos legou nada mais do que a canção 'Laudes Creaturarum'?, eu responderia: ele nos deu as imagens imortais de Giotto, belas lendas e as canções de Jacopone e de todos os outros, além de mil obras preciosas que, sem ele e o secreto poder de amor de sua alma, jamais teriam surgido. Ele foi um daqueles grandes seres enigmáticos, um dos mais antigos que, inconscientemente, ajudaram a construir a obra gigantesca e milagrosa chamada Renascença, ou seja, o renascimento do espírito e das artes".

Você pode me acompanhar também pelas redes sociais: Twitter, Facebook, Instagram, Youtube e Spotify.

Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.