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Para Mac Barnett, convidado da Bienal, crianças leem melhor do que adultos

Rodrigo Casarin

31/08/2016 09h41

Foto: Bruce Guthrie

Foto: Bruce Guthrie

"A importância da ilustração na literatura infantil: a identificação das crianças com as imagens". Este será o tema do papo que o norte-americano Mac Barnett terá com o público amanhã pela manhã na 24ª Bienal Internacional de São Paulo. Best-seller nos Estados Unidos, o primeiro título do autor que chegou aqui no Brasil, pela Intrínseca, foi "Os Dois Terríveis", história de uma criança arteira que precisa redescobrir as maneiras de aprontar quando sua família se muda para o Vale do Bocejo.

Ao olhar para o seu público, Barnett enxerga nele o melhor tipo de leitor possível, aquele que encara o livro com poucos julgamentos prévios, bem diferente do que adultos costumam fazer. "As crianças estão formando o próprio gosto e são hábeis em decodificar narrativas inovadoras, da mesma forma que criam situações sociais novas e desconcertantes. Então, no geral, acho que são melhores leitores de literatura do que os adultos", aponta em entrevista ao Uol.

untitledPara embasar sua opinião, cita os contos de Clarice Lispector e as peças escritas por Samuel Beckett, que exigem bastante dos leitores. "Quando muitos adultos encontram um trabalho de ficção novo, sentem-se desconfortáveis. Se os livros são difíceis de entender, bem, isso pode ser uma afronta à inteligência deles. As crianças não, elas se deparam constantemente com mistérios, com coisas que não entendem. Crianças e literatura estão engajadas em uma mesma busca: descobrir o que significa ser uma pessoa".

Barnett defende que o principal aspecto da literatura infantil é a experimentação. Lembra que os grandes autores que lia quando criança – Maurice Sendak, Margaret Wise Brown, Wanda Gäg e muitos outros, quase todos conterrâneos – ousavam radicalmente em suas criações e que esse deve ser um norteador de livros para tal público: é preciso sempre estar se reinventando. "Eles contavam histórias que eram formalmente inventivas e moralmente sofisticadas. Todo dia criamos novas crianças. Vamos também criar novos livros para crianças!"

Ao comentar como fazer com que crianças que crescem com celulares e tablets em mãos se interessem por livros, o autor lembra de quando tinha cinco anos e ganhou um videogame de aniversário. "Eu passava muitas horas jogando 'Super Mario Bros', mas também passava muitas horas lendo livros. Acredito que as novas tecnologias e os antigos livros podem coexistir em uma infância feliz. Celulares são convincentes, mas bons livros fazem algo a mais, algo que os celulares não podem fazer".

Aluno de David Foster Wallace

A biografia de Barnett ainda guarda uma curiosidade: ele foi aluno de David Foster Wallace (DFW), um dos escritores mais celebrados da atualidade, autor de "Graça Infinita", na faculdade de Pomona, na Califórnia. Quando disse ao mestre que gostaria de escrever livros aos pequenos, porém, teve uma resposta um tanto desapontadora "Eu não sei nada sobre escrever livros infantis", revelou DFW. Barnett retrucou dizendo que não queria aprender a escrever para esse público, queria aprender a escrever, apenas isso. "Penso que boa arte para crianças é como a boa arte no geral, ela fala sobre a verdade da vida", explica.

Não que o tempo junte de DFW tenha sido em vão, no entanto. "Aprendi muito com o Dave. Provavelmente o que mais me marcou foi a preocupação dele com o leitor, a obrigação de entretê-lo, de atrai-lo para dentro do texto, de cuidar dele, mesmo quando se exige incrivelmente seu intelecto e atenção. Penso que um livro é, basicamente, um diálogo entre o escritor e o público, que escrever é um ato social, e passei a entender isso graças ao Dave".

Sobre o autor

Rodrigo Casarin é jornalista pós-graduado em Jornalismo Literário. Vive em São Paulo, em meio às estantes com as obras que já leu e às pilhas com os livros dos quais ainda não passou da página 5.

Sobre o blog

O blog Página Cinco fala de livros. Dos clássicos aos últimos sucessos comerciais, dos impressos aos e-books, das obras com letras miúdas, quase ilegíveis, aos balões das histórias em quadrinhos.