“Tungstênio” mostra que o mundo não se divide entre vilões e mocinhos
No meio dos quadrinhos, muito já foi dito, quase sempre de maneira elogiosa, sobre "Tungstênio", graphic novel do brasileiro Marcello Quintanilha premiada na categoria Policial do Festival de Angoulême no último sábado, dia 30 – veja aqui uma entrevista com o autor sobre o feito.
Para o site Universo HQ, referência no assunto, Rodrigo Scama escreveu: "Poucos autores sabem dilatar e encurtar o tempo para contar uma história como Quintanilha. A tensão e o suspense permeiam todo o álbum. É impossível parar de ler. Você precisa saber o que vai acontecer e, ao mesmo tempo, descobrir como os personagens chegaram até o ponto em que se encontram. E o autor vai dando pistas de tudo isso ao longo da história. Ao final, todas as pontas se fecham, em um trabalho de roteiro primoroso".
Os elogios são mesmo merecidos. "Tungstênio" se passa em Salvador e mostra a história de um traficante, um militar reformado, um policial e sua mulher. Todos eles misturam elementos de heróis e vilões, e esse é o grande mérito de Quintanilha: construir personagens complexos, com virtudes e defeitos, sem nenhum tipo de idealização, como qualquer pessoa comum.
A narrativa central que acompanhamos e que serve de plano principal para que as trajetórias particulares de todos os personagens se desenrolem por meio de flashbacks também é comum: o policial abordando e tentando render dois pescadores que explodiam bombas no mar para pegar seus peixes, enquanto aguarda a chegada do reforço para que possa prendê-los. Não há nenhuma megalomania – exceto, talvez, na personalidade do próprio policial, um fortão metido a herói –, o que aproxima a obra do nosso dia a dia.
Não li os outros quadrinhos que concorriam ao prêmio vencido por Quintanilha, mas, ainda assim, asseguro que o troféu está em boas mãos. É ótimo ver que títulos nacionais nos quais realidades cotidianas protagonizadas por personagens comuns – e, por isso mesmo, interessantes – estejam ganhando destaque, seja na França, seja aqui mesmo no Brasil.
Precisamos mesmo entender que o mundo não é feito de histórias fantásticas e maniqueístas, que dividem as pessoas entre o bem e o mal. E a arte é o melhor caminho para que possamos compreender isso.
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